Dedico o presente texto a Platão, filósofo grego, que fundou a primeira academia de ensino. Era um educador! Criador da alegoria da caverna há cerva de 2.400 anos atrás.. Vamos ao texto:
Tratava-se de uma escola que sempre funcionara no interior de uma caverna, cuja entrada tinha mais de 50 metros de altura. Alunos, professores, direção da escola e demais habitantes eram separados do mundo exterior por uma muralha natural com 10 metros de altura. A iluminação no interior era pouca. Quase penumbra desde o nascer do sol. Porém durante os dias a parede da caverna parecia um cinema de sombras. A forte iluminação vinda do exterior projetava sombra de tudo aquilo que passava diante da caverna. Com base em tais imagens eram dadas as aulas pelos professores. Tudo que não tinha explicação ou causava temor era chamado de Deus.
As aulas eram dadas conforme as sombras projetadas na parede. Tais sombras eram a maior realidade que professores e alunos tinham para conhecer-se e conhecer o mundo. Certa feita, um professor curioso, na busca de comprovar tudo aquilo que aprendera e ensinava, com muito esforço conseguiu transpor a muralha e cair no mundo exterior. Como não mais voltou foi dado como morto pelos seus.
Inicialmente, acostumado à escuridão, esse professor ficou mais cego ainda. Levou alguns minutos para se acostumar ao novo mundo, tão claro e enxergar tudo como realmente era. Extasiou-se com a lua, com os sons, com o azul do céu, com os pássaros, com o verde da floresta... O sol o encantou. Olhando lá embaixo, pois a caverna ficava no meio de uma montanha, viu um prédio e foi em sua direção.
Tratava-se de um prédio público, na verdade uma escola. Chegou na hora que os professores estavam numa reunião com os alunos. Tão logo foi visto identificou-se como um professor da caverna. Foi chamado para compor a mesa. Os professores comunicavam aos alunos que entrariam em greve, as razões da greve: Os professores queriam novos notebooks, pois os que tinham consideravam velhos, com mais de um ano; dobrar a quantidade de aparelhos de ar condicionados para que a temperatura no interior da escola permanecesse com 16 graus; reivindicavam apenas 10 alunos por sala-de-aula para melhor aproveitamento, pois havia classes com até 18 alunos; que o médico e o dentista que cuidavam dos alunos passassem a visitar a escola e consultar os estudantes e professores a cada 03 dias, já que vinham somente de sete em sete dias; que o piso salarial de cada um fosse tal, que 30% fosse destinado a uma poupança, cujo saldo anual permitisse um professor, se quisesse, fazer um tour em 10 países; queriam ainda aposentar-se com 20 anos de serviço, pois eram obrigados aposentar-se compulsoriamente após 15 anos de atividade. Pretendiam trabalhar mais um pouco; Os trabalhos executados fora da sala-de-aula como estudo, avaliação e planejamento de aula era tidos como tão importantes quanto à aulas dadas, além de remunerados e outras reivindicações.
Deram a palavra ao professor vindo da caverna, para que narrasse como era a realidade do local onde vivia e ensinava. Meio constrangido disse que: As carteiras eram todas quebradas; que o piso que recebiam e a correção não observavam o disposto em lei; que havia professor que não tinha computador, nem e-mail, nem sabia como usar um computador caso tivesse um nas mãos; que o diretor era cargo de confiança escolhido pela autoridade superior; que tudo que aprendiam na caverna era através de sombras por isso pouco do ensinado servia para realidade; que o projeto pedagógico era imposição dos diretores; que a comunidade escolar não tinha direito de participar do processo educacional; que nada recebiam pelo exercício e atividades extraclasse como planejamento das aulas, estudo para se aperfeiçoarem na arte de ensinar e corrigir as avaliações dos alunos, que os professores não morriam de fome devido ao salário miserável, porque desempenhavam várias outras funções paralelas... Disse muita coisa que deixou todos escandalizados.
Acompanhou todo processo de luta dos seus colegas do mundo exterior e os viu vencer o patrão desalmado. Tiveram todos os seus pleitos concedidos. Gostaram tanto dele, que no dia que resolveu voltar para caverna disseram-lhe:
- Não. Não vá. Eles não o compreenderão! Os que têm poder utilizarão a incompreensão para jogar todos contra você. Fique conosco. Você agora é um dos nossos!
Grato e emocionado respondeu:
-Não! Sou um deles. Devo voltar para falar-lhe do mundo além da caverna, além das trevas. Contar sobre as cores, os sons, a maciez das folhas, o odor da madeira molhada, sobre as estrelas do céu, sobre o sabor do morango... dizer-lhes que até os morcegos que conosco compartilham a caverna vêm ao mundo verdadeiro. Preciso dizer-lhes que o trovão não é um deus, que as águas dos rios subterrâneos não são lágrimas dos nossos antepassados e que a brancura dos animais da caverna é albinismo, não a pureza. Que todos têm direitos, são cidadãos, têm dignidade. Que a educação é fundamental, que o aluno não terá educação de qualidade se os professores não forem devidamente valorizados. O mundo de lá não existe, sequer se trata de ficção, é um pesadelo. Preciso acordá-los! Como acordei!
Assim partiu e voltando à caverna. Ao chegar às trevas desmaiou, pois seus olhos estavam habituados à luz. Ficou tão cego em contato com as trevas quanto ao ter o contato com a luz ao chegar ao mundo exterior. Trevas e luz causam o mesmo efeito a quem nelas chega.
Contou tudo a todos, que ouviram incrédulos. Esteve nas mais variadas localidades no interior da caverna. Era aplaudido de pé. Os jovens ficavam fascinados com a narrativa, os mais velhos riam e achavam o narrador muito criativo, os sacerdotes acreditavam que ele tinha tomado alguma droga ou levado grande pancada na cabeça. Os diretores acharam uma utopia os direitos que os professores tinham do mundo exterior. Todavia, quando os primeiros jovens começaram a formar grupos para conhecer o mundo exterior, quando os primeiros professores se reuniram para reivindicar direitos, quando começaram a questionar o poder do deus trovão... sacerdotes, diretores de escola e governantes se reuniram.
Um sacerdote lembrou-se que falar mal de deus era um grande sacrilégio e também crime punível com a morte. Rapidamente ele foi enquadrado, julgado e condenado à morte. Destino que teriam todos aqueles que ousassem a seguir os passos daquele que ofendeu os deuses, que provocou tumulto, que corrompeu a juventude e professores com idéias absurdas. Sofreriam a mesma pena do homem que blasfemara contra o deus trovão e a pureza do branco, cor dos animais da caverna. Que falara mal até da escuridão. Taxaram-no de morcego de duas pernas, vez que o morcego representava o mal para eles e a corrupção, pois costumava ir ao o exterior, onde se corrompiam, por isso voltavam sempre à caverna para purificar-se.
Executado o professor que fora ao mundo exterior, que denominava mundo da luz, na caverna tudo continuou como estava, como sempre fora: sombras e trevas. Falar o nome dele levaria à excomunhão Tudo o que foi dito pelo réu passou a ser crime, caso alguém repetisse, acreditasse ou propagasse suas narrativas ou idéias. A pena: a morte!
Mas um grupo de professores, sem que percebessem, reuniam-se secretamente...
Mas um grupo de professores, sem que percebessem, reuniam-se secretamente...
Por: Valdecy Alves
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